sexta-feira, 29 de agosto de 2008

A MEU PAI

A MEU PAI

NO DIA EM QUE PARTISTE
A TERRA TREMEU,
O MUNDO ESCURECEU,
E EU FIQUEI MAIS SÓ!
SE ENCONTRARES A LUZ
REFLECTE-A PARA MIM
TALVEZ VOLTE A SORRIR!
Clementina

29-06-2005

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Não posso adiar o amor

Não posso adiar o amor para outro século
Não posso
Ainda que o grito sufoque na garganta
Ainda que o ódio estale e crepite e arda
Sob montanhas cinzentas
E montanhas cinzentas

Não posso adiar este abraço
Que é uma arma de dois gumes
Amor e ódio

Não posso adiar
Ainda que a noite pese séculos sobre as costas
E a aurora indecisa demore
Não posso adiar para outro século a minha vida
Nem o meu amor
Nem o meu grito de libertação

Não posso adiar o coração

A. RAMOS ROSA

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Saudade

Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...
Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos magoa,
é não ver o futuro que nos convida...
Saudade é sentir que existe o que não existe mais...
Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam...
Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.
E esse é o maior dos sofrimentos:
não ter por quem sentir saudades,
passar pela vida e não viver.
O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.
Pablo Neruda

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

No dia em que eu morrer

No dia em que eu morrer
Não chores porque parti,
Não chores por te deixar.
Não ponhas flores no meu caixão,
Não chores por não estar contigo!
No dia em que eu partir,
Canta o que vivemos!
O que construímos, o que deixei!
Amor, carinho, ternura, amigos!
No dia em que eu partir
Olha à tua volta,
E observa. Estarei contigo.
Não chores, eu não parti,
Uma mãe não abandona um filho!
Não ponhas flores no meu caixão,
Planta-as no teu jardim,
Elas vão crescer e florir,
Vão alegrar a tua vida,
Exalar o meu perfume,
Fazer-te cantar de alegria.
E se as lágrimas teimarem,
Deixa-as cair, suavemente,
Com alegria!
Feliz, eu não parti.
Estarei no teu coração!

Clementina
Caparide, 27 de Julho de 2008

Desconheciso

Só quando aprendemos a dominar os nossos medos....
A lutar pelo que queremos...
A compreender a dor e elevar-se com ela...
A não desistir diante das dificuldades e dos obstáculos...
E acima de tudo, a amar e perdoar....
Certamente estaremos muito próximo da felicidade tão sonhada...
Tudo, sempre depende de cada um de nós...

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Mia Couto

Liçoes

nao aprendi a colher a flor
sem esfacelar as pélalas
falta-me o dedo menino
de quem costura desfiladeiros

criança, eu sabia
suspender o tempo
soterrar abismos
e nomear as estrelas
cresci
perdi pontes
esqueci sortilégios

careço da babilidade da onda

hei-de aprender a carícia da brisa

trémula, a haste
me pede
o adiar da noite

O tempo, subitamente solto pelas ruas e pelos dias,

o tempo, subitamente solto pelas ruas e pelos dias,
como a onda de uma tempestade a arrastar o mundo,
mostra-me o quanto te amei antes de te conhecer.
eram os teus olhos, labirintos de água, terra, fogo, ar,
que eu amava quando imaginava que amava. era a tua
a tua voz que dizia as palavras da vida. era o teu rosto.
era a tua pele. antes de te conhecer, existias nas árvores
e nos montes e nas nuvens que olhava ao fim da tarde.
muito longe de mim, dentro de mim, eras tu a claridade.

José Luís Peixoto

domingo, 3 de agosto de 2008

- António Ramos Rosa

Para José Afonso

o canto que se erguia
na tua voz de vento
era de sangue e oiro
e um astro insubmisso
que era menino e homem
fulgurava nas águas
entre fogos silvestres.
Cantavas para todos
os acordes da terra,
os obscuros gritos
e os delírios e as fúrias
de uma revolta justa
contra eternos vampiros.
Que imensa a aventura
da luz por entre as sombras!
A vida convertia-se
num rio incandescente
e num prodígio branco
o canto sobre os barcos!
E o desejo tão fundo
centrava-se num ponto
em que atingia o uno
e a claridade intacta.
O canto era carícia
para uma ferida extrema
que era de todos nós
na angústia insustentável.
Mas ressurgia dela
a mais fina energia
ressuscitando o ser
em plenitude de água
e de um fogo amoroso.
É já manhã cantor
e o teu canto não cessa
onde não há a morte
e o coração começa.

- António Ramos Rosa -

sábado, 2 de agosto de 2008

David Mourão Ferreira

Penélope

mais do que um sonho: comoção!
sinto-me tonto, enternecido,
quando, de noite, as minhas mãos
são o teu único vestido.

e recompões com essa veste,
que eu, sem saber, tinha tecido,
todo o pudor que desfizeste
como uma teia sem sentido;
todo o pudor que desfizeste
a meu pedido.

mas nesse manto que desfias,
e que depois voltas a pôr,
eu reconheço os melhores dias
do nosso amor.

Alberto Caeiro

Quem me dera que eu fosse o pó da estrada

Quem me dera que eu fosse o pó da estrada
E que os pés dos pobres me estivessem pisando...

Quem me dera que eu fosse os rios que correm
E que as lavadeiras estivessem à minha beira...

Quem me dera que eu fosse os choupos à margem do rio
E tivesse só o céu por cima e a água por baixo...

Quem me dera que eu fosse o burro do moleiro
E que ele me batesse e me estimasse...

Antes isso que ser o que atravessa a vida
Olhando para trás de si e tendo pena...

Alberto Caeiro